segunda-feira, 14 de março de 2011

A CASA DA RUA HERMENGARDA



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- Mudei-me, sim, porque ela quis assim.
- Ela, quem? A Renata? Mas ela gostava tanto da casa...
- A Renata, não. A casa. Já nos mudamos há muito tempo.
- A casa, Geraldo? Como assim?
- Meu caro, “é uma longa história”, como se costuma dizer... Um tanto inverossímil, talvez, mas foi o que aconteceu. A casa obrigou-nos à mudança. Mas felizmente agora está tudo bem melhor, embora a um custo muito alto.
- O que você fez com ela? Vendeu-a?
- Ela não existe mais. Mantive-a de pé enquanto foi possível. Não sei bem para que. Talvez apenas para testemunhar, com  prazer, a sua decadência, a sua morte.
- Você agora deixou-me curioso. Esta história  guarda algum segredo ?
- Absolutamente. Se tiver paciência para ouvi-la...
- Claro que tenho.

- Lembro-me da primeira vez que a vi, imponente, soberba, edificada sobre uma pequena elevação do terreno, como a dominar todas as outras casas em torno.
Parei o carro rente ao meio-fio. Não havia nas ruas o congestionamento constante trazido pelo “progresso”, que as sufoca e não nos deixa perceber nada além do que está à frente do parabrisa. Parei o carro, dizia, do lado oposto a ela, e pus-me a examiná-la.
Dois andares. Toda branca, fachada com sacadas trabalhadas em arabescos gregos e ramos de flores delicadamente pintados em diversas cores e entrelaçados, envolvendo as janelas, feitas em esmerado trabalho de marcenaria. A entrada, pelo lado, debaixo de uma espaçosa varanda coberta por um delicado telhado de ferro e vidro, como mandava a moda de então. “Kitsch” e de gosto duvidoso, como se diria hoje em dia, mas destacado e marcante, na sua época. Uma beleza.
No portão, uma tabuleta : "À venda".
Logo me encantei por ela. Agradava-me o local, a vizinhança, o comércio bom e suficientemente distante para que o local conservasse a quietude do ambiente residencial.
Por que estaria à venda? Percebia-se que havia sido construída com o carinho de quem pretendia que fosse o seu abrigo definitivo. Estava vazia, e dos corretores, que procurei, a informação que obtive não me convenceu: mudaram-se, os donos, porque desgostaram-se do local...
Somente mais tarde vim a saber o verdadeiro motivo. Mas então já não havia mais nada a fazer.
- Você está fazendo suspense...
- Não, não estou, e você irá ver porque me expressei assim.
Ali mesmo comecei a imaginar a reação de Renata, quando a visse. Por certo seria amor à primeira vista, como o que senti. E não estava errado.
Quando comentei com ela sobre a casa, apesar do adiantado de sua gravidez, fez-me voltar à rua Hermengarda ainda naquela noite, excitada com o meu entusiasmo, com o qual compartilhou assim que viu a mansão.
Pude então apreciar o local de outro ângulo, agora sob a calma noturna. Era ainda mais agradável.
Daquela visita noturna a fecharmos o negócio, foi um pulo. A mudança também foi logo decidida e até bastante facilitada, pois resolvemos comprar todo o mobiliário em estilo art nouveau, dominante, na época. Queríamos que o interior refletisse a beleza exterior do nosso novo lar.
Mal havíamos nos instalado e o futuro primogênito começou a dar sinais de também querer participar da nossa alegria. Com efeito, duas semanas depois as “primogênitas” nasceram: Priscila e Letícia vieram completar a nossa felicidade.
No princípio, tudo foi maravilhoso. As meninas cresciam cercadas de amor e carinho por mim e por Renata, que parecíamos dois adolescentes apaixonados. Nossa vida era tranquila e sem maiores problemas além daqueles ditos normais que um casal enfrenta, ao adoçar as inevitáveis arestas que um relacionamento a dois traz às suas vidas.
Priscila e Letícia, agora já na escola, todos os dias após as aulas e feitos os deveres de casa, gostavam de brincar nos jardins, de lidar com as plantas e de vê-las brotarem das sementes que deitavam à terra. A jardinagem era tarefa que adoravam.
Um dia, pediram-me que eu levasse duas mudas de alguma árvore que “crescesse bastante”, segundo palavras delas, pois pretendiam plantá-las uma de cada lado da casa, para que no futuro emoldurassem a bela fachada. Levei duas mudas de fícus, colocadas por elas mesmas nos locais previamente escolhidos. Deram seus próprios nomes às futuras árvores, que cresceram sadias e viçosas. Quando Priscila e Letícia completaram dez anos, as suas xarás já ultrapassavam em muito suas alturas.
Mas nem tudo era alegria. Eu sentia que havia algo naquela casa que às vezes me causava profundo mal estar. Parecia-me estar sendo constantemente observado e vigiado, embora nunca nada de anormal eu tenha presenciado. Comentei com Renata essa estranha sensação, e para surpresa minha ela disse que também sentira, por mais de uma vez, que alguém estava seguindo os seus passos. Não eram fantasmas. Não havia cortinas esvoaçantes, lustres que se balançavam ou arrastar de correntes. Era mais sutil. Nada havia de anormal, à exceção daquela sensação de constante e desagradável vigília.
Parecia-nos que a casa nos observava, que éramos invasores nas suas entranhas. Sentíamos que não éramos benquistos por ela, que ela apenas tolerava conceder-nos abrigo. Nós a mantínhamos cuidada, limpa e frequentemente pintada com esmero, mas nada do que fazíamos conseguia... agradá-la, vamos dizer assim.
Começaram, então, a acontecer conosco pequenos acidentes. Encanamentos novos apareciam com vazamentos, telhas quebradas deixavam que a água da chuva danificasse o reboco e a pintura, curtos-circuitos queimavam a fiação. Eram fatos inexplicáveis, em uma obra feita com materiais nobres e até mesmo com algum luxo.
Era ela mesma, a casa... Estava sempre voltada contra nós. Não éramos, para ela, seus donos. Ela, sim, queria dominar-nos, queria ser a nossa proprietária.
Mas apesar disso a vida continuava, dentro do possível, alegre e feliz, pois não deixávamos que aquela sensação tomasse conta de nós, e tínhamos o cuidado de nada passar para as duas meninas.
Elas estavam cada vez mais contentes com a jardinagem e o desenvolvimento das suas árvores. “Priscila” e “Letícia”, agora já bastante crescidas e com um porte altivo, faziam jus a seus nomes. Eram tão lindas quanto as duas crianças.
Jamais houve arrependimento de nossa parte por termos feito a compra, pois deixávamos em segundo plano os incômodos que vinham acontecendo. Já estávamos há quinze anos na rua Hermengarda, e embora agora o trânsito fosse bem mais intenso e um tanto barulhento, não nos incomodava. Temos a tendência de acomodarmo-nos às coisas à nossa volta, quando elas vão piorando lentamente.
Eu sentia que a nossa atitude, sempre positiva, irritava a nossa senhoria. Parecia-nos que nada a agradaria mais do que ver-nos longe dali.
Priscila e Letícia eram agora duas mocinhas encantadoras, prestes a comemorar os seus quinze anos com uma bela festa, que estava sendo preparada em seus mínimos detalhes, por elas e por Renata, já há muito tempo. Seria nos amplos jardins em volta da residência, que se prestavam muito bem para essas ocasiões. Espalhar-se-iam mesas pelo gramado e um tablado armado acolheria os dançarinos e a orquestra.
Foram ultimados os preparativos, a contratação do buffet e da orquestra e enviados os convites.
Tudo pronto, chegou o tão esperado dia.
Os jardins e o interior da casa estavam já repletos de convidados, e eu e Renata serpenteávamos entre eles, como bons anfitriões. Esperávamos todos pela chegada das duas aniversariantes, que não tardariam a descer.
Foi quando tudo aconteceu.
Do alto da escada, lindas e sorridentes, as duas meninas recebiam os aplausos dos convidados. Dois botões em flor, prestes a desabrochar para a vida, com a alegria juvenil estampada nas faces. Jamais poderei esquecer aquele quadro.
Então, quando começaram a descer os primeiros degraus, Priscila, que vinha um pouco atrás, desequilibrou-se inexplicavelmente, e rolou pelos degraus abaixo, trazendo consigo a irmã, na violenta queda. E o que poderia ter sido um acidente talvez sem maiores consequências, transformou-se em uma tragédia, inesperada e sem sentido.
Eu não podia acreditar no que estava se passando. As minhas duas filhas, em dois centros cirúrgicos, ao mesmo tempo, sendo submetidas a delicadas intervenções onde as esperanças de êxito eram mínimas. Saídas do esplendor de uma festa, debutantes em toda uma vida que tinham pela frente, jaziam agora ali inertes, entregues a mãos que certamente mudariam o seu destino.
Eu andava de um para outro lado, na pequena sala de espera do hospital, procurando compreender por que tudo aquilo havia acontecido. Renata permanecia sentada, de cabeça baixa, apertando nervosamente nas mãos os dois vestidinhos que haviam enfeitado tanto as me-ninas, há apenas pouco mais de uma hora. Estávamos mudos, perplexos pelo fatídico desenrolar dos fatos.
Por fim, ambos os médicos, quase ao mesmo tempo nos deram a terrível notícia - se resistissem ao pós-operatório, elas estariam condenadas a cadeiras de rodas.
A nossa vida passou a girar em torno das meninas. Priscila e Letícia não sofreram danos apenas nos movimentos, mas também na fala. As suas mentes não haviam sido lesionadas, por isso era triste vê-las tentando comunicar-se conosco, e nem sempre conseguindo o seu intento. Lágrimas lhes vinham às faces, quando não conseguíamos compreender o que queriam nos transmitir.
Continuamos morando na rua Hermengarda, na casa que tornou-se lúgubre e sombria. Para nós, seus indesejáveis inquilinos.
Um dia sentei-me num degrau no alto da escada, da mesma escada causadora da tragédia. Examinei-a bem. Não havia nada que pudesse vir a provocar um acidente - um piso escorregadio, uma taboa solta, coisas assim. Eram degraus comuns, centenas de vezes utilizados por todos nós, sem que nenhum perigo fosse detectado. Eu tinha a impressão de que, naquele triste dia, as meninas haviam sido empurradas escada abaixo por alguém... inexistente. Enquanto dava tratos à bola, percebi que, curiosamente, a sensação de estarmos sendo vigiados arrefecera, e confirmei o que já havia imaginado - a tristeza estava em nós, não na casa. Ao contrário, eu sentia que ela agora estava alegre, morbidamente alegre com a tragédia que se abateu sobre nós. Pensava, talvez: “Agora falta pouco para que me deixem em paz...”
Ao mesmo tempo que me vinham estes pensamentos, eu os repelia, logicamente, por absurdos. Mas eles retornavam. A casa estava pacientemente esperando que mudássemos dali para que ela ficasse em paz.
Absorto, deixei escapar em voz baixa:
- Que loucura...  
- O que foi, meu bem?
Eu não tinha visto Renata aproximar-se.
- Você está ai, querida? Não a tinha visto...
- De que você falava?
- Ora... nem eu mesmo sei... Ando pensando umas bobagens... Eu acho que esta maldita casa quer que a gente se mude.
Renata não escondeu o seu espanto:
- A casa quer o quê?
- Eu não disse que era bobagem? Renata, há mais de quinze anos sentimos essas estranhas sensações de que a casa está contra nós. Quanta coisa nos aconteceu aqui, sem explicações! Sempre cuidamos dela tão bem, com tanto carinho, sempre foi tão linda e elogiada por quem nos visitasse... Por que tantos estragos, tantos vazamentos, curtos-circuitos e tudo o mais? Agora, essa tragédia... Ela está forçando-nos a mudar para outra casa.
 - Geraldo... Você está exagerando...
- Ela está forçando-nos a uma mudança - repeti.
- Será o fantasma do antigo dono, talvez... - Renata sorriu.
- Eu não disse que são fantasmas. É a casa, é ela que não nos quer aqui. Lembra-se que os médicos disseram que com muita dedicação e muita fisioterapia talvez conseguíssemos substancial melhora nas meninas? Pois bem, mais do que temos feito é impossível, e nada conseguimos até hoje.
- É verdade.
- Vamos nos mudar, Renata. Eu entrego os pontos.
- Mas que absurdo, Geraldo ! Vamos nos mudar porque a casa quer assim ?
- Vamos então conversar com Priscila e Letícia. Elas também já não estão gostando desse mausoléu.
- Geraldo ! Não fale assim. Mausoléu é para os mortos...
- E é o que esta casa vai ser, se continuarmos aqui. Essa casa vai acabar conosco.
Expus minha idéia às meninas, ainda que contra a vontade de Renata. Elas não se assustaram, ao contrário, apoiaram-me sem restrições. Apenas, Letícia recomendou que nos desdobrássemos em cuidados com as suas árvores.
- Reguem... as... árvores... Sempre, sempre...
Não era um pedido difícil de ser atendido, este que com extrema dificuldade ela nos fazia. As duas frondosas árvores já não necessitavam de cuidados, mas eu não me furtaria de atender tão inocente solicitação. Não iria jamais contrariar minha filha.
- Converse... com... elas... - Priscila completou.
- Conversar o que, minha filha ?
- Diga-lhes... que nós... as amamos muito...
Eu não imaginava quão importantes eram aqueles majestosos fícus para as duas.
Quando viu a reação das filhas, Renata convenceu-se. A mudança seria melhor para todos, enfim. Mais ainda para as duas, pois talvez estivessem sentindo-se presas àquele lugar que tanto mal lhes causara.
Enfim, mudamo-nos. Outra casa - esta sim - clara, bastante ventilada e alegre. De um só pavimento, embora espaçosa, o que facilitaria a locomoção de Priscila e Letícia. Além disso, tinha uma boa piscina, onde as duas poderiam tratar-se mais facilmente pela hidroterapia, prática essencial para o seu tão desejado restabelecimento.
Continuei indo, em dias alternados, aguar as duas árvores. A princípio nada falava com elas, mas com o tempo percebi que comecei até a “dar-lhes notícias” das meninas. “Que coisa ridícula...”, pensei um dia. Mas ao mesmo tempo veio-me à lembrança o pedido de Patrícia, e envergonhei-me de ter pensado assim. Sorri e falei:
- Até depois de amanhã... Minhas filhas amam vocês duas...- e fui-me embora. Desse dia em diante convenci-me de que elas me escutavam...
Com a hidroterapia, as duas meninas começaram a ter visíveis melhoras. Alegrava-nos vê-las, a cada mês, a cada semana mesmo, conseguirem pequenos movimentos onde antes havia apenas membros inertes.
- Está vendo, Renata? Eu não disse que aquela casa era amaldiçoada?
- Francamente, Geraldo. Não foi a hidroterapia, então ?
- Bem, a hidroterapia ajudou bastante. Mas livrarmo-nos daquele mausoléu foi primordial...
- Lá vem você com a história do mausoléu. Tem ao menos regado as árvores, como Letícia lhe pediu? - e, marota: - E conversa com elas, também?
- Claro, dia sim, dia não. Não preciso mais regá-las, mas converso com elas... Não há possibilidade de esquecer-me, a casa está no meu caminho. Sabe? Está acontecendo uma coisa curiosa por lá...
- O que?
- Os galhos novos das duas árvores estão crescendo na direção da casa.  
- Como assim?
- Pois é, estão quase encostando nas paredes. Não crescem para o lado da rua. E as raízes estão à flor da terra, enormes, voltadas também para a fachada.
- Geraldo, você continua com essas idéias místicas...
Não eram “idéias místicas”. As raízes continuavam serpenteando em direção às paredes e à varanda lateral. Pequena rachadura já se insinuava sob a janela da sala.
Eu nada fiz para impedir, propositadamente.
Certo dia, conversando com um amigo meu, médico, que já não via há bastante tempo, ele comentou que havia uma equipe médica especializada, dentro da neurologia, em distúrbios da fala, que estava realizando verdadeiros milagres neste campo.
- Mas é na Suíça... - ele ponderou.
Imediatamente fiz contato telefônico com o cirurgião, expondo-lhe com minúcias o caso das minhas filhas. Ele deu-me esperanças, embora nada pudesse afirmar sem exames detalhados.
Não pensei duas vezes. Fomos, nós quatro, ao encontro do médico, e em pouco mais de uma semana estávamos em seu consultório. Foram feitos todos os exames, dezenas deles. A conclusão foi que havia, em ambas as meninas, grandes coágulos comprimindo a região do cérebro responsável pela fala. As cirurgias seriam possíveis, com alguma possibilidade de êxito e um longo período de restabelecimento, uma vez que somente após a certeza dos resultados elas estariam aptas a uma viagem de volta tão longa.
Foram mais de seis meses, entre as cirurgias e a recuperação. A operação havia sido um sucesso. Durante esse tempo, Priscila e Letícia recuperaram substancialmente a capacidade de falar. Continuaram, paralelamente, com o tratamento hidroterápico, e os movimentos a cada dia eram mais visíveis.
Quando voltamos, deixamos por lá as cadeiras de rodas.
As duas meninas não cabiam em si, de alegria. Dois anos haviam se passado desde a triste queda, e elas já se locomoviam com alguma desenvoltura, sendo necessário apenas o auxílio de bengalas.
Eu estava eufórico, Renata mais ainda.
- Renata, tudo está “caminhando” - sem trocadilho - tão bem... Desde que abandonamos a rua Hermengarda as coisas estão se desenrolando...
- É verdade. Estranha coincidência...
- Pode ser. Estou me lembrando que desde que voltamos ainda não fui conversar com “Priscila” e “Letícia”... Amanhã mesmo passo lá. Daqui a pou-co as duas xarás começam a me cobrar o cuidado com as suas arvores.
- Renata...
Eu estava pálido. Há pouco mais de meia hora havia saído, para meus afazeres, e voltava agora para casa, com visível mal estar.
- Que cara é essa, Gerald? O que houve?
- Você nem imagina! As árvores cresceram muito...
- E daí? Passamos tanto tempo fora... Quase um ano... E há quanto tempo você não vai lá?
- Não é só isso... As raízes estão levantando a casa. Há enormes rachaduras nas paredes... Os galhos penetraram pelas frestas das janelas, e agora, já grossos, começam a arrebentar o telhado... Quase não se vê mais a casa, da rua. As duas árvores, frondosas, a escondem...
- Meu Deus... Vamos lá, quero ver isso de perto...
Desde aquela manhã passei a ir todos os dias, sem falta, para ver que rumo tomavam tão insólitos acontecimentos. Eu precisava entrar no terreno, pois da rua viam-se apenas duas árvores frondosas, que encobriam completamente a construção. A cada vez que eu ia, o lento processo de crescimento das duas árvores parecia mais devastador. A marquise de vidro que cobria a varanda estava estilhaçada. As portas e janelas arrebentadas por grossos galhos que invadiam suas entranhas. O telhado desabara, vencido pelo furor de dezenas de braços gigantescos. Enormes rachaduras provocadas pelas raízes, que estouravam os pisos, completavam a visão dantesca.
Um dia, já quase chegando ao meu antigo lar, não me deixaram passar. A rua Hermengarda estava interditada. Segui a pé, e de longe avistei diversos carros da Defesa Civil e soldados e pessoas dentro de cordões de isolamento. Na rua, o povo, curioso, comprimia-se. Apressei o passo, o coração quase saindo-me pela boca. Dei-me a conhecer, às autoridades, e antes que eu entrasse no terreno esclareceram-me a origem de tanto tumulto.
A imponente construção havia desabado, fragorosamente. Nada mais restava, além de um enorme monturo, misturado com os galhos das duas árvores, que continuavam eretas, imponentes.
“Priscila” e “Letícia” haviam feito justiça. 





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